Stephen King é um autor que, durante muito tempo, aos meus olhos, estava mais
preocupado em contar uma boa história do que com sua conclusão em si. E apesar de seus
livros atuais terem melhorado neste quesito, ainda continuo com a mesma
impressão. E, levando em conta seus livros da década de 1970 e 1980, isso é
quase uma regra. Principalmente com aqueles verdadeiros calhamaços como a "Dança
da Morte" e o livro que estaremos debatendo
hoje: It, A Coisa....
Antes
de mais nada, tenha em mente que Steve criou
um universo intrincado de obras onde muitas de suas histórias, de uma forma ou de outra, se conectam criando uma realidade compartilhada – mais sobre isso AQUI –
e, dentro deste conceito abordado pelo autor, alguns pontos deste universo são
realmente vórtices de energias ruins.
E, um desses pontos É Derry...
Derry
é uma cidade peculiar. Contra as probabilidades dos especialistas a cidade
conseguiu se desenvolver relativamente bem. Para alguns moradores é um local
bom para se viver, para outros tantos, é uma cidade amaldiçoada. Ao final das
mais de mil páginas do livro It você
se inclinará a concordar com o segundo grupo...
Durante
a narrativa, vemos como uma porção de catástrofes e desastres assolaram a
cidade: um incêndio matando vários em um clube; a chacina a uns foragidos da
lei com participação de grande parte da cidade; o homem que matou vários com um
machado enquanto outros assistiam sem se importar e mais outras tantas
tragédias que parecem indicar que Derry é um local amaldiçoado. E esta maldição
tem um nome: Pennywise...
Pennywise,
apesar de ter uma manifestação física, está em toda Derry. Em todo sentimento
negativo que nasce pela face escura de cada indivíduo e que é potencializada,
ou iniciada, pela influência maligna de Pennywise...
Pennywise,
o palhaço dançarino assassino, é uma criatura que nem sempre se apresenta nesta forma –
apesar de esta ser a mais corriqueira. Tudo depende do seu medo. Alimentando-se
do medo das pessoas, Pennywise esteve presente em todas essas tragédias e tem
um interesse especial por crianças e somos apresentados a ele quando este
decide matar Gerogie Denbrough – naquela cena icônica do barquinho e o palhaço
no bueiro...
Quando
li "A Zona Morta", minha primeira experiência com King, percebi que mais do que amedrontar as pessoas, os livros dele conseguem evocar um turbilhão de sentimentos dentro de nós. Você
se vê, ao menos parcialmente, em alguma situação semelhante à dos personagens
retratados. Mesclado a isto, adicione a escrita detalhista do autor para tornar
cada livro uma verdadeira viagem sobre sentimentos e relações humanas.
King consegue influir neles uma realidade incrível que parece serem seres de
verdade que a qualquer momento irão sentar ao nosso lado da poltrona e
interagir conosco...
E
é isto, a relação entre nossos personagens unidos pelo mesmo destino (Ka-tet), que é destruir o palhaço
assassino, que tornam It um dos
melhores livros (se não o melhor) de Stephen King...
O terror volta a assombrar a cidade de Derry no verão de 1985. Um jovem é morto e
tem seu braço arrancado. Apesar disso não constar nos relatórios oficiais da
polícia, um palhaço fora visto na cena do crime. Este evento traz à tona um
juramento feito ha 30 anos por sete crianças que mediante um pacto de sangue
prometeram retornar a Derry caso o horror daqueles tempos ressurgisse. O livro
é narrado de forma não linear alternado presente e passado e acompanhamos a
vida de nossos personagens em duas épocas distintas. E, apesar da vida adulta
deles ser interessante, é na relação entre eles enquanto crianças os melhores
momentos do livro...
Apesar
de termos umas pinceladas de terror nas páginas iniciais do livro, Stephen
King, como de praxe, prefere desenvolver os personagens de forma amiúde para
que nos familiarizemos com eles e nos importemos. É desta forma que
acompanhamos as crianças Michael Hanlon (o único que quando adulto ficou em
Derry sendo o primeiro a sentir sua presença), Richard Tozier (o piadista),
Eddie Kaspbrak (hipocondríaco), Bill Denbrough (o líder não declarado do
grupo), Stanley Uris (o escoteiro), Beverly Marsh (a garota do grupo e minha
personagem preferida) e Ben Hasncon (o gordinho e construtor da tropa) formarem
o Loser's Club, E depois, separados em suas vidas adultas – que a exceção de
Beverlly, não é tão interessante assim...
O
Loser’s Club, é um grupo de desajustados que encontram força e camaradagem para
superar toda a sorte de mazelas que os espera. E põe mazelas nisto: bulliyng, violência doméstica, problemas
psicológicos, morte, ausência, preconceito, racismo, são todos componentes que tornam a vida de
nossas crianças triste (em alguns casos um inferno!!!), mas apoiados e amparados um no outro conseguem mostrar
a beleza que a vida pode ter ainda que esteja envolta em catástrofes. E esta
interação entre eles evoca um sentimento de nostalgia que chega a doer. É
impossível ler estas páginas e não sentir uma saudade imensa dos tempos de
crianças e lembrar das brincadeiras, medos e aventuras daquela época...
E
Penywise sabe que os Losser’s tem poder.
Isto fica claro desde o dia em que Ben encontra Bill e Eddie na represa ao
fugir do maníaco Henry - um adolescente perturbado que exemplifica muito o
espirito da cidade. É como se eles, Bill e Eddie estivessem esperando Ben
chegar para começar a compor Ka-tet.
Outro ponto latente disso é quando Eddie está no hospital e uma áurea de
energia quase sólida emana deles. E eles sabem que só eles podem deter a Coisa
– como eles chamam o palhaço – pois os adultos não conseguem senti-lo. É como
se estivessem anestesiados pelo poder da Coisa como quando o pai de Beverlly a
persegue e um senhor olha indiferente e entra pra dentro de casa como se nada
estivesse acontecendo (e por falar em Beverlly, quando lembro do que essa guria passou quando criança e viu isto se repetir quando adulta, me dá uma tristeza imensa, principalmente por saber que esta é a realidade de muitas mulheres por aí...)
Apesar
de imenso, o livro consegue te prender e o final vertiginoso é devorado como a
voracidade de um homem que encontra um oásis no deserto. Ainda temos de quebra
uma passagem por entidades cósmicas do Kingverso
representadas de forma mais clara em sua saga A Torre Negra. E, aqui cabe uma
comentário breve: apesar do final célere, ele é meio maluco parecendo uma viagem de LSD que traz à tona o que eu disse
lá no inicio desses apontamento: King não se preocupa muito com finais...
Ler
It é como andar em uma montanha russa de emoções. Medo, alegria, felicidade,
surpresa, nojo, raiva..., uma miríade de sensações que bagunçam nossa mente. São várias as
situações que nos fazem lembrar de nós quando crianças e que são escritas de
tal forma que é impossível não desejar um retorno ao passado pra reviver
aqueles dias...
It,
A Coisa é um livro que versa muito além de terror. É um tratado sobre como a
amizade é importante e de como fatos marcantes na infância moldam nosso caráter
futuro...
Pode apostar seu couro nisso.
Obs.: lá pelo final do livro tem uma
cena envolvendo Beverly que nem sei
direito o que pensar. Faz quase um mês que li o livro e ainda não
cheguei a uma resolução quanto ao que vi. Entretanto, num primeiro momento achei
desnecessário e de uma falta de tato muito grande do autor...
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It, a Coisa ( It, Eua, 1986)
Páginas: 1103
Autor: Stephen King
Editora: Suma de Letras
Comprar: AMAZON
6 COMENTÁRIOS
Concordo, o livro é muito mais que medo de palhaço e terror...mas o final deixa muito a desejar, na realidade todos os livros do KING que li, me deixaram com essa sensação, a história é sensacional, os personagens são ótimos, é difícil parar de ler (tua metáfora com o deserto foi boa, seguimos lendo com a esperança de encontrar um oásis...mas no final...só uma poça de água...) . Mesmo assim, como você, também daria 5 estrelas pro livro...e também continuo sem entender o propósito da cena da Beverly com os meninos...
Se não fosse esta cena no final do livro mencionada na resenha, It A Coisa seria meu livro preferido dentre todos que li até hoje !!
Eaí Julie, tdo certo por aí?
Pois então! Eu costumo dizer que sou meio fanático por Stephen King, acho que por isso não me incomodo muito com o final do livros (hahaha). Acho que a caminhada envolvente da guiada pela escrita do autor meio que compensa o final - muitas vezes abaixo do esperado.
Mas, a cena da Beverly com os meninos é algo..., se o livro não tivesse me cativado tanto, mexido positivamente comigo, provavelmente aquela cena poria tudo à perder (que merda o King que fazer com aquilo???)
Feliz por ter gostado da resenha. Passe mais vezes...
Abraços!!!
Eaí Murilei, tdo certo?
Pois é, cara. Ao final do livro fiquei pensando exatamente isso. "It" é um livro que beira a perfeição mas aquela cena..., o autor poderia - e devia - ter usado outro recurso para o fim que as crianças precisavam. Teria tornado este livro, sem sombra de dúvidas, o melhor que já li.
Abraços.
Eu gostei de seu artigo, é muito interessante conhecer todos esses dados que você diz. It A Coisa se tornou em uma das minhas histórias preferidas desde que li o livro, e quando soube que seria adaptado a um filme, fiquei na dúvida se eu a desfrutaria tanto como na versão impressa, mas adorei. A Coisa filme completo é uma das histórias de Stephen King que eu mais gostei até agora. Sem dúvida teve uma grande equipe de produção. A história é muito interessante, realmente a recomendo. Já estou esperando o seu próximo projeto, seguro será um sucesso.
Olá Andrea!
Eu também adorei o filme. Estava com um pouco de receio já que a versão do filme da década de 80 ou 90, não lembro ao certo, me deixou uma má impressão. Tbm estou ansioso pela sequência...
Abraços!
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