"The Jinx: as vida e as mortes de Robert Durst" I ou, como esse cara não está preso???


          "...Que desastre. Ele estava certo. Eu estava errado. E o arroto. Estou com dificuldades com a questão. O que diabos eu fiz? Matou todos eles, claro."      
  
The Jinx foi uma série documental que na época de seu lançamento pela HBO causou certo borburinho ao mostrar a vida, no mínimo, peculiar de Robert Durst, um milionário herdeiro de uma das mais influentes famílias de New York, e como este, apesar de ser o principal suspeito em três casos de homicídio – em um deles esquartejou a vítima – com as pistas apontando diretamente pra ele, conseguiu se safar de todas as acusações. Ao final da série, o sentimento que prevalece é de desolação mesclado ao desespero. E se você assistiu Making a Murdur e se perguntou como o cara estava preso, aqui, a pergunta é oposta: como ele não está preso?

Dirigido e produzido pelo diretor Andrew Jarecki, a ideia de realizar o documentário surgiu ao acaso. Jarecki  havia gravado o filme "Entre Segredos e Mentiras" (A Good Things, 2010) , que contava a vida de Robert Durst. Com Ryan Goslyn e Kristen Durst no elenco, o filme, mediano, não chamou atenção de muita gente. Porém, a película conseguiu chamar atenção do próprio Robert Durst que entra em contato com Jarecki e lhe explica que gostaria de gravar uma entrevista com o diretor para mostrar sua versão da história. Ninguém imaginava o que resultaria disso – talvez só um dos advogados dele...

Andrew Jarecki não faz nenhuma reinvenção da roda no documentário – a não ser um fator que falaremos adiante. Ele vai agrupando uma porção de entrevistas, imagens de arquivo, recortes de reportagens, volta e meia há umas cenas muito bem encenadas..., porém, o autor quebra linearidade da narrativa mesclando passado e futuro. Essa técnica é boa pra manter a atenção do telespectador mas (MAAAAASSSS) por conta do final da série que acabou trazendo à tona fatos inéditos, a possível edição com sua linha temporal confusa pode levantar certos questionamentos. Mas, tudo isso, toda essa acuidade não se equipara a Durst no quesito prender atenção...

Desde seus primeiros momentos na tela Durst se mostra um ser diferente, cheio de tiques, falas que parecem ensaiadas, e até uma certa antipatia. Nascido dentro  de uma família que fez fortuna através do ramo imobiliário, Robert traz consigo o trauma de ter visto a mãe suicidar-se. Complexos Freudianos à parte, é difícil conceber que tal fato não ocasionasse nenhuma sequela psicológica . De inicio, na vida adulta, seu pai havia decido que ele seria o herdeiro do império, porém, a medida que os anos foram passando, seu pai notou que o filho mais velho não tinha os mecanismos empreendedoristas necessários e o preteriu em favor do filho do meio. Daí em diante a relação entre Robert e sua família foi conturbada  com acusações pra lá e pra cá. O fato é que Robert sempre se sentiu só e quando se encontra com Kathleen Durst vê nela uma alma gêmea. Se casam. Para o azar dela. Kathleen seria a primeira das supostas três vitimas de Robert Durst.


E, por falar em Kathleen Durst, o maior rol de entrevistas é sobre seu desaparecimento. Vale salientar que mesmo tudo indicando que o autor do crime seja Robert, Jarecki não tenta induzir o público a pensar isso ou o oposto. Se bem que nem precisou. Dois policias com visões distintas sobre o caso (cada qual com seu motivos particulares, um deles em especial) já fazem isso. O mesmo ocorre com as amigas de Kathleen que vão investigando o caso já que a policia, na época, parece não ter dado muita bola para o fato...

Jarecki, provavelmente receberia um dez com louvor se esse fosse seu TCC. O documentário vai recriando passo a passo a vida de Robert no decorrer da narrativa. Aquele homem que parecia apenas um senhor como qualquer um, vai se mostrando mais e mais perturbado empurrando sempre mais nossa mente a formular a questão de que ele realmente é um assassino. E Jarecki toma cuidado pra não se interpor em demasia na narrativa sabendo os momentos certos de questionar Robert. E, sobre as entrevistas de Robert, podemos citar duas coisas muito peculiares: 

PRIMEIRA: em dado momento em uma pausa nas entrevistas, Robert fala algumas coisas sozinho como ensaiando um discurso e é advertido por um dos responsáveis da equipe técnica que mesmo com as câmeras desligadas, ainda é possível ouvir o que ele fala graças ao microfone pendurado em sua capela que continua gravando.Guarde esta informação... 

SEGUNDA: um dos advogados de Robert orienta-o no sentido de não realizar as entrevistas pois algo poderia ser dito ou descoberto que complicasse Robert de alguma forma. Nostradamus aplaudiria isso...

Entretanto, porém, todavia, existe um mas: na última cena do documentário, Jarecki acaba se deparando com uma evidência (prova?) muito contundente que implica Robert em um dos crimes e que a policia não tinha conhecimento e o confronta. Após isso, a equipe termina de gravar e esse seria o final do documentário. Seria! Esquecendo que seu microfone ainda está ligado, Robert vai ao banheiro e acaba proferindo a frase que abre esses apontamentos. Após isso sobem os créditos. Palmas e vivas. Do ponto de vista do espetáculo é algo fabuloso. Terminar uma série documental com uma bomba dessas é pra te fazer ir para às páginas e blogs dos meios mais importantes do meio cultural e entender o que foi aquilo. Agora, saindo do espectro artístico e indo para o plano real, aqui temos um problema: o que você faz quando se depara com uma evidencia que pode resolver um crime? Segue servindo apenas a arte pra proporcionar um final apoteótico? Chama a policia e mostra para os agentes da lei e deixa que eles decidam o que fazer, podendo prejudicar sua película?

Essas perguntas foram muito debatidas na época que The Jynx foi lançado. Pelo fato de não ser muito claro com sua linha do tempo, Jarecki não informa ao certo quando teve acesso a declaração final de Durst. Disse que tudo foi descoberto bem depois de terminada as gravações quando um dos homens da edição estava revisando tudo, quase na época do documentário pronto. Por isso não informou a policia. Hoje a equipe que trabalhou no documentário não comenta mais o assunto...

Não vou me delongar aqui sobre o debate ético do que Jarecki fez  - afinal tem muita coisa sobre isso por aí na net – e independente disso The Jynx é um documentário excepcional que trata da vida de um homem perturbado que viveu uma vida solitária e triste e culminou com sua índole psicopata que nos brinda com mais um exemplo da carnificina que só a amente humana pode produzir...



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The Jinx: A Vida e Mortes de Robert Durst (The Jinx: The Life and Deaths of Robert Durst, EUA, 2015)
Roteiro: Andrew Jarecki, Marc Smerling, Zachary Stuart-Pontier
Direção: Andrew Jarecki
Duração: 280 min.


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