[RESENHA] Os Filhos de Anansi, de Neil Gaiman



        "O mais importante sobre as canções é que elas são como as histórias: não valem droga nenhuma, a menos que alguém as escute."  

Neil Gaiman, possivelmente, é um dos autores que melhor sabe explorar o mundo das mitologias transformando cada uma delas em algo único. Suas obras são aclamadas no mundo todo e a capacidade do autor de surfar por várias vertentes mitológicas vem desde quando ele era roteirista de uma das mais aclamadas HQs: "Sandman". De lá pra cá, o autor foi se tornando um verdadeiro mestre nesta seara e é impossível não maravilhar-se com a destreza do autor em tratar temas por vezes desconhecidos. É o caso da fantástico "Os Filhos de Anansi".


Os Filhos de Anansi é um livro que sabe dosar divertimento, ação e drama na medida certa. A história começa nos apresentando Fat Charlie, que preparando-se para o casamento, sede aos desejos da futura esposa e convida seu pai, que há muito não via, para a cerimônia. Daí por diante, Charlie  acaba descobrindo que seu pai na verdade está morto e, mais ainda, era um deus. E não qualquer deus: seu pai era o deus dono de todas as histórias. Seu pai era Anansi. Não bastando tudo isso, acaba por descobrir que tem um irmão, Spider, e que este herdou os dons do pai tendo também poderes de deus. Daí em diante sua vida só se complica.

Histórias de fantasia conseguem atrair nossa atenção pelo surreal, pelo fantástico. Porém, as verdadeiras narrativas que ficam impregnadas na nossa mente advém de fatores e problemas muito mundanos e reais. E podemos ver esses fatores presentes em várias obras de Gaiman: "Coraline" e sua tristeza com seu pais e "O Oceano no Fim do Caminho" que aborda temas como amadurecimento e amizade. Aqui, o que se vê de forma mais nítida é o retrato de que familiares mantém um certo rancor com seus pares genéticos.


Neil Gaiman

Charlie dentre outros motivos, guarda rancor do pai por este tratá-lo como um idiota e por vezes o expô-lo ao ridículo. Inclusive, todos o conhecem por Fat Charlie, graças a seu pai que tem um dom incrível que é o das palavras. Esse ranço seguiu Chrlie por toda a vida e é difícil pra ele aceitar que um ser tão poderoso como seu pai podia fazer o que fez. Outro ponto fraterno que vem perturbar a vida de Chraly é seu irmão, Spider. Tudo fica mais devastador para nosso personagem quando seu irmão passa a investir até em sua noiva. Porém, no fim das contas, Charlie e Spider mostram que a verdadeira família, por mais complicada que possa parecer, poder ser nosso verdadeiro trunfo antes os desprazeres da vida...

Outro ponto bem explorado por Gaiman aqui é o poder das narrativas. Durante muito tempo, as histórias e tradições eram passadas para gerações futuras através das palavras faladas. Mesmo após o surgimento da escrita, muitos tradições mantinha-se através da fala – é o caso do incio do nosso cristianismo. E esse poder de "contar histórias" é o maior poder de Anansi. É como se o autor fizesse uma reverência a todos os contadores de histórias, inclusive à ele mesmo. O que seria de nós, homo sapiens sem a capacidade de narrar histórias, fatos e mitos? 

Talvez, você esteja se perguntando que a leitura possa ser um pouco dramática ante o que foi escrito acima. Isso está bem longe da verdade. Gaiman conseguiu criar uma história bem divertida nos presenteando com algumas cenas muito engraçadas permeadas por doses cavalares de ironia...

Apesar de não estar no mesmo nível que seu melhor livro "Deuses Americanos" (claro, na minha opinião) Os Filhos de Anansi sabe explorar muito bem o campo da fantasia nos dando de brinde uma imersão na mitologia africana que apesar de rica, é bem pouco conhecida aqui de nós e de quebra nos mostra que apesar de todas as confusões, diferenças e desavenças, a família é sempre um bem muito importante...

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Os Filhos de Anansi ( Anansi Boys, Eua, 2005)
Páginas: 328
Autor:  Neil Gaiman
Editora: Intrínseca
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