[RESENHA] Vozes de Tchernóbil, de Svetlana Aleksiévitch


"Destino é a vida de um homem, história é a vida de todos nós. Eu quero narrar a história de forma a não perder de vista o destino de nenhum homem"  




Em 1997, uma escola no distrito de Columbine sofreu um atentado de dois estudantes ceifando 12 vidas. A opinião pública tentou traçar uma relação entre o massacre e o fato dos dois jovens, Eric Harris e Dylan Kelbold, escutarem o rock de Marilyn Manson (o que provou-se um erro já que mais tarde descobriu-se que os jovens detestavam Marilyn Manson). Quando o cineasta Michael Moore entrevistou o músico para seu documentário ganhador do Oscar “Tiros em Columbine”, ele perguntou o que Manson diria para as vítimas acerca de tudo que está acontecendo. Manson respondeu: “nada. Eu não diria nada. Eu ouviria o que eles tem a dizer. O que pouca gente fez até agora!”

Esta premissa de Manson, de escutar o ponto de vista das vítimas não é muito usual. Sempre que um determinado acontecimento de proporções gigantescas ocorre, aparecem especialistas na tentativa de elucidar o porquê de tal cabendo as vítimas apenas um pequeno espaço quando, na verdade, elas deveriam ter suas vozes ouvidas e ecoadas. É isso que a ganhadora do Nobel de Literatura Svetlana Aleksiévich faz em seu emocionante Vozes de Tchernobil sobre o desastre que aconteceu na usina Nuclear de Tchernobil, Ucrânia, em abril de 1986. 

Chegar até o final do livro é como levar um soco no estômago haja vista o aporte emocional presente naqueles relatos. E mais ainda: notar que por mais que nossa empatia trabalhe para diminuir a distância entre o sofrimento alheio e a indiferença, ainda há um abismo que nos distancia de quem sente até hoje o peso da radiação. 
Falam da guerra. Da geração da guerra. Comparam… A geração da guerra? Mas ela é feliz! Tiveram a Vitória! Isso lhes deu uma grande energia vital, ou, como se diz agora, uma poderosa carga de vivência. Eles não temiam nada. Queriam viver, estudar, ter filhos. E nós? Nós temos medo de tudo. Tememos pelos nossos filhos, pelos netos que ainda não temos. (…) Todos estão depressivos. O sentimento é o de estarem irremediavelmente condenados. Para uns, Tchernóbil é uma metáfora, um símbolo. Para nós, é a nossa vida. Simplesmente a vida.  
Svetlana, por um longo período entrevistou um número sem fim de pessoas que tiveram suas vidas modificadas naquele dia. Deixando sua voz de lado para dar lugar a outras vozes, a autora, que nasceu na Bielorrussia, pais que recebeu a maior dose de radiação, faz um compilado devastador, angustiante, pesado, triste e esperançoso do que é a vida pós Tchernóbil. E de que quebra ainda ilustra um panorama do era ser  “o homem” soviético.


Aqui, acompanhamos os relatos angustiantes da esposa que insiste em visitar o marido, bombeiro, vítima da radiação; da mãe que luta para que a filha, que nasceu com sequelas graves, possa ter um tratamento adequado e não sucumba ao preconceito; das várias pessoas que não querem – e não o fazem – abandonar a terra onde nasceram, hoje, contaminada pela radiação; das crianças que tiveram que deixar seu cãozinho para trás. Foram mais de 500 entrevistas que compilam um cenário triste e angustiante do que é a vida pós Tchernóbil.

Mesmo sem usar sua voz para descrever o que representou aquele  desastre, a altora sabe muito bem intercalar os vários depoimentos de forma a tornar o que poderia ser uma Quimera em uma narrativa coesa e dinâmica. 


Eu tenho doze anos. Passo o dia todo em casa, sou inválida. O Carteiro traz à nossa casa duas pensões, a minha e a do meu avô. As meninas da minha turma, quando souberam que eu tinha câncer no sangue, ficaram com medo de sentar do meu lado. De me tocar. Mas eu olhava as minhas mãos, a minha pasta e os meus cadernos. Não havia nada de diferente. Por que tinham medo de mim? Os médicos disseram que eu adoeci porque o meu pai trabalhava em Tchernóbil. Mas eu nasci depois disso. E eu amo papai.    

Entre esses tantos relatos há espaço para um vislumbre do que foi o homem soviético. Um cidadão resiliente que sempre acreditou na figura de um líder salvador mas que na verdade, era só um joguete nas mãos de quem não se importava e se vê perdido com o desmembramento da União Soviética.

Muito do que é relatado no livro de Svetlana parece mais um conto fictício. E não me refiro ao governo que só revelou o que realmente ocorrera quando já era impossível mantes a farsa, mas sim, como aquele insidioso dia pode destruir tantas vidas e modificar a forma como muitas deles observam o que estar vivo.

Longe de ser um livro de ler, Vozes de Tchernóbil é um emaranhado caótico organizado que ilustra o poder de uma narrativa forte quando se dá espaço aos verdadeiros personagens  de uma tragédia. Não espere sentir-se melhor após a leitura, pelo contrário: certas imagens narrativas ão de se misturar nos seus pensamentos diários e  o resultado é a tristeza e impotência. Porém, observar que aquelas pessoas, as vítimas da radiação, a despeito de todo sofrimento ainda acreditam que possa existir algo de bom após a radiação, te faz acreditar que possa existir beleza neste mundo. Mesmo depois da "rosa".
Boa Leitura.

Vozes de Tchernóbil ( Chernobylscaya Molitva, Chernobyl Prayer, 1997)
Páginas: 384
Autor:  Svetlana Aleksiévith
Editora: Companhia das Letras
Comprar: AMAZON 

[RESENHA] 1984 I "Guerra é paz, liberdade é escravidão, ignorância é força..."


Nota: ★★

Caso não tivesse se tornado um escritor de ficção tão aclamado mundialmente, George Orwell, provavelmente, teria gravado seu nome na história. Foi um cronista e resenhista muito famoso e polêmico no seu tempo além de ter participado da Guerra Civil Espanhola – relato este que se tornou livro, “Lutando na Espenha” (Homage to Catalonia, 1938) – onde o autor além de fazer um relato sobre sua passagem pela guerra, faz uma crítica ferrenha ao regime comunista soviético. Porém, como muitos espíritos dotados de talento e inquietação, Orwell alçou voos maiores e entregou dois livros que são duas grandes alegorias e metáforas sobre as fraquezas humanas e o estado controlador, tendo como foco inspirador a União Soviética de Joseph Stalin – mas não restringido somente a isto: “Revolução dos Bichos” (Animal Farm, 1945) e “1984”. Aqui, trataremos do segundo que acabou por ser o último livro do autor que morreu no ano seguinte a publicação da obra.

1984 é o grande clássico das distopias. O mundo, após sucessivas guerras, acabou dividido em três grandes blocos: Eurásia, Lestásia e Oceania que estão sempre em guerra, mudando apenas quem ataca quem e qual bloco faz aliança com qual. O livro foca sua narrativa no personagem Winston Smith, morador de Londres (cidade que pertence ao bloco da Oceania) funcionário dO Partido (que controla tudo)que começa a questionar a realidade na qual está vivendo pois nota que o que vê, ao que tudo indica, não está de acordo com o que o lhe contam. Falando assim, parece só mais uma distopia que nos últimos tempos lotam as livrarias com suas narrativas ficcionais e que são esquecidas logo após o ponto final. Porém, 1984 é uma imersão em um mundo controlado por um governo onisciente que toca profundamente a psique de quem se aventura por essas páginas.

LEIA TAMBÉM: Alan Moore e sua visão do governo opressor e a apatia do povo

O livro é divido em três partes: a primeira trata de explicar o mundo onde Winston está inserido; a segunda foca nas inquietações do personagem; a terceira narra o desfecho dessa história. Navegando por essas três partes, Orwell cria um universo com um forte paralelo com a União Soviética de Stálin. O Partido que controla tudo está presente em toda seara de relações humanas. Seu comandante é o onipresente e onisciente “Big Brother” que observa tudo através das Teletelas - espécie de televisões que além de transmitirem conteúdo servem para espiar a vida das pessoas. Mas, o monitoramento não fica restrito a isso. A vida de cada individuo é observada de perto pelos membros do partido e até um sorriso em um momento inoportuno pode ser indicio de subversão.


E não é só pelo medo que todos são controlados. Com sua estrutura perene, o estado cria novas ferramentas para manter-se no controle. Desde novas versões pra fatos do passado até um novo idioma. Indo além e incutindo nas pessoas a ideia de que verdades excludentes podem coexistir desde que de acordo com os anseios e vontade do Partido. É o tal do Duplipensamento: 2+2=5... toda essa maquinaria dividida entre os vários ministérios do governo, não levam em conta o bem estar do população e sim a conservação da estrutura do Partido...

No momento em que escrevo esta resenha, estou lendo o livro Vozes de Tchernóbil (The Chernobyl Prayer, 1997), de Svetlana Alexijevich, Nobel de Literatura. Um livro fantástico sobre a catástrofe nas usinas nucleares na Ucrânia, e em meio a tantos relatos, um que se sobressai é a forma como o governo soviético controla as pessoas. Fica claro, através dos depoimentos, que o Estado anulou o individuo sobrando um ser que vive em prol dEle. Estado este que usa de suas artimanhas e hediondez para manter-se vivo. Orwell conseguiu transmitir em suas páginas essa mesma figura claustrofóbica e temível na figura do Big Brother. Entretanto, como o autor já disse em entrevistas, seu livro não é apenas uma critica ao Stalinismo mas a toda forma de totalitarismo e suas práticas.


Hoje, sempre consta na ordem do dia de algum mandatário, ou aspirante a tal, a figura de algo ou alguém que pode levar a derrocada  de nossa sociedade: os imigrantes, as mulheres, os gays, os comunas, os capitalistas.., são muitos os “monstros” à espreita só no aguardando da oportunidade para dar o bote. Fazem isso com o intuito de causar medo e repulsa e uma vez que compramos a ideia eles passam a ter o poder de fazerem o que quiserem. E, vejam, isso não é exclusivo de governos de esquerda. Muitos governos de viés liberais também tem seus monstros a serem combatidos. É só assistir a qualquer jornal que será fácil enxergar isto...

Em 1984, esse grande vilão é Emmanuel Goldstein. Um traidor da pátria com sua eterna tentativa de revolução, porém, o que fica subentendido é que Goldstein nem exista sendo somente um artificio  do governo para justificar suas posições questionáveis e sua tirania contra o povo.


O final do livro é de um pessimismo acachapante. Ali, no mistério do Amor (ironicamente chamado assim pois neste ministério é que ocorrem as torturas), vemos como o Estado usa de todo seu aparato  para obrigar as pessoas a dobrarem-se a sua vontade. Não há escapatória. Na época, muitos criticaram Orwell por essa visão desesperada e pessimista. O que eles esquecem é  do momento histórico no qual o livro fora concebido:

A Segunda Guerra Mundial recém havia terminado; o mundo ainda respirava o medo radiônico de Hiroshima e Nagasaki; a ONU havia aprovado a divisão da Palestina em dois estados contra a vontade do povo ÁrabeStalin continuava à frente do vasto império soviético; e tinha se consolidado os dois blocos da Guerra Fria. Num cenário como este, onde o fim do mundo radiativo se apresentava com uma ideia nada absurda e os governos demonstravam sua força para além da misericórdia humana, não é de espantar que Orwell capitou esse negativismo e transcreveu isso em suas páginas. Eu, da minha parte, achei o final condizente com tudo que fora apresentado na obra.

1984, antes de ser um estudo do passado é um alerta sobre o futuro. Sobre como nós, como sociedade, como povo e como nação nos comportamos ante as pessoas, instituições e corporações que tentam nos controlar através do medo, do desejo, da necessidade, do messianismo. E, como bem sabia o Big Brother: “quem controla o passado controla o futuro”


Pra fechar este corolário, em uma época em que o medo pode nos levar a acreditar em qualquer governante que apresente uma solução imbecil, cito uma frase de uma Graphic Novel que gosto muito, V de Vingança
"Igualdade, justiça e liberdade são mais que palavras, são perspectivas"  

Boa Leitura.

1984 ( 1984, 1949)
Páginas: 416
Autor:  George Orwell
Editora: Companhia das Letras
Comprar: AMAZON

E agora, o que sobra depois disso tudo?


Outro dia filmei algumas formigas fazendo seu trabalho habitual. Elas caminhavam em fila, cada qual levando seu fardinho de folhas com seu propósito bem delimitado por sua programação biológica. Não sei o que se passa na cabeça de uma formiga; se ela para e pensa: bem, hoje não vou trabalhar! Vou ir pro baile anual das formigas natalinas pois a vida é muito curta, ou coisa assim. O fato é, ao que tudo indica, o propósito da formiga é este: nascer, crescer, carregar folhas – reproduzir, quando pertencente a esta casta- e morrer, mesmo que elas não saibam disso...

Daquele dia em diante, e cada vez com mais frequência, me pergunto qual o sentido da vida. Para o religioso a resposta e bem simples: isso aqui é só um laboratório onde você será testado no decorrer da sua vida. Cada escolha sua determinará qual será seu destino em uma outra vida. Agora, para pessoas que não são assim, tão atadas a princípios místicos, as coisas podem não ser tão simples assim... 

Claro, há aqueles que creem que não há propósito algum sendo a vida uma simples manifestação de processos químicos e biológicos e que um dia, de acordo a Termodinâmica e sua Entropia, tudo resultará em uma estagnação total de energia levando ao que chamamos de morte. Mas, infelizmente, não me sinto pertencente a nenhum desses dois grande grupos...

Sendo assim o que me resta? Qual seria o sentido de tudo isso? E, acima de tudo: será que há algum sentido em tudo isso?

Sim, eu sei que muitas pessoas melhores e mais inteligentes que eu se debruçaram sobre estas questão e muitos, provavelmente a maioria, falhou em chegarem alguma conclusão que sanasse seus questionamentos. Mesmo assim, é complicado não pensar nisso. De uns tempos pra cá muitos que me são próximos estão partindo deste plano e toda vez que isso ocorreu – alguns inclusive novos demais – perguto-me: e agora? Será que há algo além da luz branca no fim do túnel? Será que há o tal túnel? E a luz?

Por vezes vejo tanta maldade no mundo, tanta gente boa padecendo que me forço a acreditar que tende haver algo. Não pode ser justo que haja tanto sofrimento direcionado a pessoas boas ou inocentes sem que exista alguma coisa atrás da cortina que dê a verdadeira felicidade a essas pessoas. Não pode ser justo acabar tudo assim, eternamente para aquela criança que morreu porque uma bomba jogada por alguém em um banker acertou o alvo errado; ou que aquele jovem tenha morrido porque suas células simplesmente começaram a se reproduzir de forma desenfreada...

E tem momentos que chego a uma espécie de esboço de conclusão que, enfim, é só isso mesmo. As asas indiferentes do azar estão aí roçando em qualquer um e é impossível determinar quem será o próximo acariciado pelo seu abraço. E tanto uma conclusão quanto a outra me assustam!

Havendo um outro Onde, quem define quem vai para o lugar bom e o lugar ruim? Não, não compactuo com a ideia de um ser divino, misericordioso e de amor que deixaria seus filhos arderem eternamente no fogo da perdição. Dona Lú, senhora minha mãe, com todas as suas loucuras e contradições não deixaria que isso ocorresse com este que vos escreve. Imagina em ser de amor! E, no outro espectro, viver assim, sabendo que após isso não há nada, o que sobra para esses que foram tão cedo e não puderam desfrutar daquilo de bom que nosso mundo doido e inconstante tem para oferecer?

Claro que não cheguei à conclusão alguma. Ideias assim são abstrusas demais para uma mente tão pequenina que nem a minha. Quem sabe algum dia chegue a alguma conclusão. Ou talvez a ciência evolua e possa provar a totalidade dessas coisas. Ou eu possa ser tocado pela chama de algum espectro divino e me encontre em alguma forma de fé onde as respostas serão todas respondidas. Enquanto isso, tento ser que nem as formiguinhas com seu caminho, tentando viver com algum propósito, mesmo sem saber qual propósito seria...  


Livros de Sangue: vol. 1 I o horror em sua forma crua


Livro de contos de Clive Barker

Nota: ★★

Clive Barker conseguiu se firmar como um expoente do terror e fantasia graças a sua grandiosa imaginação. Adentrar o universo criado por Barker é ter certeza de perscrutar histórias que trarão uma gama acachapante de sensações: medo, nojo, ansiedade, prazer, lascívia,  tudo se mistura neste caldo e o resultado só poderia ser ótimo.

Livros de Sangue é uma série de seis livros de contos. Neste primeiro volume, somos apresentados a seis contos onde a surpresa é o que impera. O autor consegue surpreender de forma ímpar com suas histórias que além de inventivas, são escritas com um detalhismo tão profundo que não seria surpresa acreditar serem fatos verdadeiros não fosse a natureza surreal do enunciado.

O primeiro conto, “Livro de Sangue”, que serve como uma espécie de prelúdio tem como premissa uma casa assombrada. Mas, não espere para uma narrativa comum de fantasmas e demônios: uma investigadora de fenômenos paranormais está fascinada com seu novo pupilo, porém, ela desconhece que as mentiras dele irão despertar a ira dos mortos. Neste conto, além de muito terror e violência, há uma nuance muito forte e presente nos livros de Barker: o sexualização - que é retratada de forma mais forte em outro livro seu resenhado aqui no blog, O Desfiladeiro do Medo  - resenha AQUI

Os outros contos vão desfilar toda a genialidade de Clive Barker. Os roteiros são bem engendrados e os personagens são de uma pluralidade incrível. Desde um psicopata (O Trem da Carne da Meia Noite), passando por um porco (Blues do Sangue de Porco) que te fará enxergar esses bichos com outros olhos. E temos até um gigante feito de pessoas (Nas Colinas, as Cidades). De todos eles, destaco o incrível “O Yattering de Jack”, onde um demônio tenta assombrar um homem em particular, porém não será nada fácil. Neste, o humor negro impera dando um tom irônico e inventivo ao conto.  

Livros de Sangue, Vol. 1  é um livro raro por essas bandas e quando encontrado, o preço acaba por afugentar o leitor. Mas, caso você consiga ter acesso a este incrível material, terá de concordar com o que o mestre do terror, Stephen King, disse sobre Clive Barker: “Eu vi o futuro do Horror... E seu nome é Clive Barker”.

Boa Leitura!


Livros de Sangue: vol. I ( Books of Blood: vol. I, 1984)
Páginas: 233
Autor:  Clive Barker
Editora: Civilização Brasileira

[RESENHA] Servidão Humana | um ode a inquietação, abismos e asas...

Neste misto de autobiografia e ficção, o final da jornada só é superado pelo caminho feito até ali...


Nota: ★★

Se você me perguntar como cheguei a este livro a resposta é a seguinte: Se7evn – os sete pecados capitais. Caso você não tenha visto este filme, veja e saberá do que estou falando. Nunca havia lido nada do autor e fiquei maravilhado com sua escrita que consegue criar uma imersão profunda pautada na vida de sofrimento e superação do personagem central que tem um "Q" de autobiografico...

No livro somos apresentados a Phillip Carey que nasce com uma deformidade no pé que sempre será um ponto fraco físico e psicológico. Não bastando isso, a roda indiferente do destino fez com que o personagem perdesse os pais e fosse criado pelos tios que atados a compromissos religiosos com a paróquia, não tem tempo (talvez vontade?) de dedicar o amor que Phillip necessita - principalmente o tio. Doravante, acompanhamos a vida de Phillip, desde sua educação primária com forte viés religioso, passando pelo descobrimento dos prazeres sexuais, as mudanças na forma de ver e se relacionar com o mundo e, talvez o que, num primeiro momento chama mais atenção, sua relação de amor e ódio com Mildred...

Servidão Humana foi escrito no ano de 1915. Como muitos autores da época, William Somerset Mugham, em seus primeiros livros, faz uma mescla de sua vida e ficção: se no livro o Phillip é claudicante, William é gago; ambos estudaram em escolas religiosas e, posteriormente passam a ver a religião como algo claustrofóbico que serve mais para escravizar do que salvar o individuo...

Passeando por muitas searas do conhecimento – arte, filosofia, história, religião... – o autor consegue discorrer com maestria por todas elas de forma profunda, reflexiva e de agradável leitura – ficando só um pouco cansativo os momentos em que ele se alonga em demasia por vários parágrafos discorrendo sobre alguns pintores...

Independente de partilhar ou não com a visão do autor, é inegável que suas ideias tem um embasamento forte o que no mínimo gera um ponto de interrogação na cabeça do leitor. Principalmente no que concerne ao campo da religião: neste tema específico, vemos como Phillip vai aos poucos deixando que mais e mais incertezas tomem forma em sua mente fazendo com que as regras e dogmas cristãos fiquem de lado ante suas próprias sensações e vivências...  

E apesar de flutuar por muitos temas abstratos e intelectuais, o autor não deixa de lado as relações humanas. Assim, vemos a avareza e desejo de nortear a vida de seus pares na figura de seu tio, ou a da boêmia que leva ao ocaso na figura de um conhecido escritor que Phillip conhecera em Paris. Tudo isto feito de forma não apenas a te jogar informações mas para que você sente-se de frente para o espelho e pense: e eu, como vejo tudo isso? Mas, falar de servidão Humana e não citar a relação de Phillip e Mildred é impossível...

Desde as primeiras aparições de Mildred, o autor já deixa claro que ela terá um papel importante no sofrimento e, posteriormente, amadurecimento de Phillip. A forma como ele decide abordar esta relação imprime uma inquietação e até um dose de raiva: as humilhações que Mildred impõem a Phillip remetem aqueles relacionamentos em que uma das partes crê que de uma hora para outra o outro irá se transformar ante o amor lhe dispensado e toda sorte de sofrimento irá acabar. E neste caminho, Phillip, além de sofrer e amargar o dissabor da desilusão, acaba deixando de abraçar outras oportunidades de ser feliz...

Mas esta relação é uma espécie de microcosmo representando toda a vida de Phillip. Sua desilusão com a religião, a descida até a miserabilidade culminando com o limiar da fome até a redenção na figura de um conhecido, traçam um paralelo com a relação nada sadia dele e Mildred. É como se os picos de felicidade entremeados com longos períodos de sofrimento fossem uma extensão direta de sua devoção quase mística a Mildred...

Ler Servidão Humana é mergulhar num mundo onde as certezas sobre o que se é e como se vê as coisas são apenas borrões. Não há nada definido e no percurso de se encontrar no mundo você é jogado no mais puro abismo. Porém, ao se ver envolto nas asas das incertezas e das angústias, para aqueles que não se deixam sucumbir, é possível vencer os muros das próprias barreiras psicológicas e alçar vôos até então inimagináveis...

Boa leitura

Servidão Humana ( Of Human Bondage, 1915)
Páginas: 605
Autor:  William Somerset Mugham
Editora: Globo

[RESENHA] A Guerra do Paraguai | Ou, as mutações da história...

Apesar de importante, o maior conflito armado da America do Sul é pouco conhecido o que permite muitas interpretações para o mesmo fato...


Nota: ★★

O que mais me impressionou logo nas primeiras páginas deste livro foi notar que pouca coisa sabia a respeita desta guerra, que durou de 1864 a 1870. A começar pelo nome: se aqui no Brasil batizamos de Guerra do Paraguai, por lá eles chamam de Guerra da Tríplice Aliança. E a desinformação não fica restrito ao nome do conflito. Com intenções políticas, figuras históricas foram alçadas ao patamar de heróis enquanto outros foram rebaixados ao status de demônios.  E ainda temos a questão que sempre emerge quando ocorre um conflito: de quem foi a culpa? Luiz Octavio de Lima, através de extensa pesquisa, mostra que as coisas não são assim tão claras e precisa-se de um pouco de parcimônia para entender com clareza este conflito que devastou o Paraguai e fortaleceu as forças armadas brasileiras que, dentre outros fatores, culminariam com a Proclamação da República anos depois.

Muito provavelmente você já deve ter escutado que o Paraguai em meados do século XIX era uma potência tecnológica e financeira, totalmente autossuficiente e que rivalizava, comercialmente, com a toda poderosa Inglaterra. Os ingleses, feridos em seu orgulho, não poderiam admitir isto e instigaram Brasil, Argentina e Uruguai a começarem uma guerra contra o Paraguai para findar com esta crescente potência. Ao que tudo indica, isso está muito longe da verdade. Pelo menos é o que assegura o autor.

Segundo ele, todos os países envolvidos no conflito eram majoritariamente agrícolas. Nenhum deles tinha um comercio de produtos manufaturados dignos de nota lhes restando apenas o comercio de produtos primários. Inclusive o Paraguai. Então, o que motivou a guerra, já que Isabel II, Rainha da Inglaterra na época, não teve culpa no cartório? Para Luiz Octavio de Lima, os motivos são, basicamente, um reflexo da consolidação dos estados nacionais independentes e questões geopolíticas da região – fruto direto do conflito que trouxe a independência do Uruguai...

Explicando: na ânsia de viabilizar outra saída marítima para escoar sua produção, para não ter de depender dos humores de Buenos Aires, Francisco Solano Lopes, general e presidente paraguaio também chamado de El Mariscal, firma uma aliança com o Uruguai num pacto de defesa mútua. Quando o Brasil, por conta de querelas entre uruguaios e fazendeiros gaúchos, decide intervir no Uruguai, Solano Lopes cumpre o acordo de defesa mútua e, não seguindo os conselhos de seu pai que antes de morrer pediu para que o filho jurasse não entrar em guerra com o império, ataca o Brasil. Aí, temos o início de nossa guerra. Logo em seguida o presidente uruguaio é deposto subindo ao trono um mais favorável a causa brasileira e se junta a Don Pedro II, imperador brasileiro, no conflito contra o Paraguai. Com a adição de Bartolomeu Mitre, a Argentina entra no conflito e o cenário daquilo que seria a mais sangrenta e duradoura guerra da América do Sul está montado.

No livro, ficamos sabendo que o Paraguai possuía um grande exército e ainda contava com a bravura de seus soldados. Isso, porém, não foi suficiente para derrotar a tríplice aliança. E ao final da Guerra, temos um Paraguai devastado – nisso, é difícil precisar quantos paraguaios morreram, alguns estimam em 90% da população masculina e outros em 25% - e com percas territoriais significativas. Claro que olhando esses números fica fácil julgar culpados os comandantes da Tríplice Aliança por essa carnificina, porém, não podemos esquecer o estrago causado pelo próprio Mariscal ao seu povo.

Solano Lopes, já sabendo que não teria mais condições de vencer o conflito, poderia hastear a bandeira branca e poupar seu povo de muito sofrimento. Apesar de hoje ser adorado, Solano Lopes era um tirano: perseguiu muitos adversários políticos, mandou açoitar a própria mãe e matar um irmão. Enquanto o povo passava fome, ele desfrutava de uma vida opulenta, tanto que Elisa Lynch, sua esposa, era tida como uma das pessoas mais ricas da região.

É óbvio que vilões não se encontram apenas no lado Paraguaio. Como toda guerra, as máscaras da maldade ficam sempre dos dois lados e nós também temos nossos demônios e o principal deles, provavelmente, é o genro de Don Pedro, Cond’Eu. Aqui, não vou me delongar muito porque estou escrevendo algo sobre isto mas não posso deixar de mencionar dois fatos calamitosos perpetrados pelo conde: um incêndio num hospital de feridos que matou vários paraguaios sem condições de combater e, talvez o mais triste, O Massacre de Acosta Ñu.

A batalha de Acosta Ñu, que ocorreu no dia 16 de agosto e que marca o dia das crianças no Paraguai, foi uma passagem realmente triste da nossa história. Basicamente, Solano Lopes, com seu exército já devastado, recrutou crianças (CRIANÇAS) para lutar contra o exército brasileiro e este, comandado pelo Cond’Eu não se fez de rogado em mata-las. Ou melhor, MASSACRÁ-LAS. Muitas delas – a maioria – nem armas tinham, mas isso não arrefeceu os ânimos do conde e o que se viu foi uma carnificina/covardia sem tamanho. Pouco depois deste conflito Solano Lopes fora morto e a guerra acabou - aí você pensa: o que leva um comandante a colocar crianças pra lutarem e adversários lutarem com elas? Como já disse uma vez:

"será que encontraremos absolvição para o mundo, para nossa a nossa felicidade e até para a harmonia eterna se, em nome disso, para solidificar essa base, for derrubada uma lagrimazinha de uma criança inocente? Essa lagrimazinha não legitima nenhum progresso, nenhuma revolução. Nenhuma guerra. Ela sempre pesa mais. Uma só lagrimazinha..."  

Logo após a guerra, a figura de Solano fora demonizada no Paraguai como alguém que levou o país ao colapso.  O que não é totalmente verdade. Em meados do séc. passado, muitos revisionistas, com propósitos políticos claros, metamorfosearam a figura del Mariscal como alguém quase santo que lutou contra a tirania de países que tinham como interesse servir aos desejos da Inglaterra. O que, excetuando, segundo o autor a parte da Inglaterra, não é totalmente mentira. É dessa época que vem a ideia de um Paraguai quase paradisíaco.

Longe de ser um livro definitivo sobre o tema, A Guerra do Paraguai, de Luiz Octavio de Lima, consegue lançar luz sobre algo pouco conhecido da história do Brasil e tenta espantar ideias propagandísticas sem nenhum viés histórico e documental.

Claro, não me assustaria que daqui algum tempo, algum outro politico use isso,  guerra, com algum viés pessoal. Por isso que livros assim são importantes.

Obs.: a despeito de qualquer coisa e do quanto eu tenha gostado do livro, uma só narrativa, por mais bem feita que seja e com a melhor das intenções, não pode ser a base para nosso pensamento a respeito das coisas. Sendo assim, outros livros e artigos são necessários para formar uma ideia, ao menos aproximada de fatos que ocorreram e ocorrem a nossa volta...


Boa leitura.


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A Guerra do Paraguai (2016)
Páginas: 448
Autor:  Luiz Octavio de Lima
Editora: Planeta
Comprar: AMAZON

[RESENHA] It - A Coisa | Muito além de um palhaço assassino...


Stephen King é um autor que, durante muito tempo, aos meus olhos, estava mais preocupado em contar uma boa história do que com sua conclusão em si. E apesar de seus livros atuais terem melhorado neste quesito, ainda continuo com a mesma impressão. E, levando em conta seus livros da década de 1970 e 1980, isso é quase uma regra. Principalmente com aqueles verdadeiros calhamaços como a "Dança da Morte" e o livro que estaremos debatendo hoje: It, A Coisa....

Antes de mais nada, tenha em mente que Steve criou um universo intrincado de obras onde muitas de suas histórias, de uma forma ou de outra, se conectam criando uma realidade compartilhada – mais sobre isso AQUI – e, dentro deste conceito abordado pelo autor, alguns pontos deste universo são realmente vórtices de energias ruins. E, um desses pontos É Derry...

Derry é uma cidade peculiar. Contra as probabilidades dos especialistas a cidade conseguiu se desenvolver relativamente bem. Para alguns moradores é um local bom para se viver, para outros tantos, é uma cidade amaldiçoada. Ao final das mais de mil páginas do livro It você se inclinará a concordar com o segundo grupo...

Durante a narrativa, vemos como uma porção de catástrofes e desastres assolaram a cidade: um incêndio matando vários em um clube; a chacina a uns foragidos da lei com participação de grande parte da cidade; o homem que matou vários com um machado enquanto outros assistiam sem se importar e mais outras tantas tragédias que parecem indicar que Derry é um local amaldiçoado. E esta maldição tem um nome: Pennywise...

Pennywise, apesar de ter uma manifestação física, está em toda Derry. Em todo sentimento negativo que nasce pela face escura de cada indivíduo e que é potencializada, ou iniciada, pela influência maligna de Pennywise...

Pennywise, o palhaço dançarino assassino, é uma criatura que nem sempre se apresenta nesta forma – apesar de esta ser a mais corriqueira. Tudo depende do seu medo. Alimentando-se do medo das pessoas, Pennywise esteve presente em todas essas tragédias e tem um interesse especial por crianças e somos apresentados a ele quando este decide matar Gerogie Denbrough – naquela cena icônica do barquinho e o palhaço no bueiro...

Quando li "A Zona Morta", minha primeira experiência com King, percebi que mais do que amedrontar as pessoas, os livros dele conseguem evocar um turbilhão de sentimentos dentro de nós. Você se vê, ao menos parcialmente, em alguma situação semelhante à dos personagens retratados. Mesclado a isto, adicione a escrita detalhista do autor para tornar cada livro uma verdadeira viagem sobre sentimentos e relações humanas. King consegue influir neles uma realidade incrível que parece serem seres de verdade que a qualquer momento irão sentar ao nosso lado da poltrona e interagir conosco...


E é isto, a relação entre nossos personagens unidos pelo mesmo destino (Ka-tet), que é destruir o palhaço assassino, que tornam It um dos melhores livros (se não o melhor) de Stephen King...

O terror volta a assombrar a cidade de Derry no verão de 1985. Um jovem é morto e tem seu braço arrancado. Apesar disso não constar nos relatórios oficiais da polícia, um palhaço fora visto na cena do crime. Este evento traz à tona um juramento feito ha 30 anos por sete crianças que mediante um pacto de sangue prometeram retornar a Derry caso o horror daqueles tempos ressurgisse. O livro é narrado de forma não linear alternado presente e passado e acompanhamos a vida de nossos personagens em duas épocas distintas. E, apesar da vida adulta deles ser interessante, é na relação entre eles enquanto crianças os melhores momentos do livro...

Apesar de termos umas pinceladas de terror nas páginas iniciais do livro, Stephen King, como de praxe, prefere desenvolver os personagens de forma amiúde para que nos familiarizemos com eles e nos importemos. É desta forma que acompanhamos as crianças Michael Hanlon (o único que quando adulto ficou em Derry sendo o primeiro a sentir sua presença), Richard Tozier (o piadista), Eddie Kaspbrak (hipocondríaco), Bill Denbrough (o líder não declarado do grupo), Stanley Uris (o escoteiro), Beverly Marsh (a garota do grupo e minha personagem preferida) e Ben Hasncon (o gordinho e construtor da tropa) formarem o Loser's Club, E depois, separados em suas vidas adultas – que a exceção de Beverlly, não é tão interessante assim...

O Loser’s Club, é um grupo de desajustados que encontram força e camaradagem para superar toda a sorte de mazelas que os espera. E põe mazelas nisto: bulliyng, violência doméstica, problemas psicológicos, morte, ausência, preconceito, racismo, são todos componentes que tornam a vida de nossas crianças triste (em alguns casos um inferno!!!), mas apoiados e amparados um no outro conseguem mostrar a beleza que a vida pode ter ainda que esteja envolta em catástrofes. E esta interação entre eles evoca um sentimento de nostalgia que chega a doer. É impossível ler estas páginas e não sentir uma saudade imensa dos tempos de crianças e lembrar das brincadeiras, medos e aventuras daquela época...

E Penywise sabe que os  Losser’s tem poder. Isto fica claro desde o dia em que Ben encontra Bill e Eddie na represa ao fugir do maníaco Henry - um adolescente perturbado que exemplifica muito o espirito da cidade. É como se eles, Bill e Eddie estivessem esperando Ben chegar para começar a compor Ka-tet. Outro ponto latente disso é quando Eddie está no hospital e uma áurea de energia quase sólida emana deles. E eles sabem que só eles podem deter a Coisa – como eles chamam o palhaço – pois os adultos não conseguem senti-lo. É como se estivessem anestesiados pelo poder da Coisa como quando o pai de Beverlly a persegue e um senhor olha indiferente e entra pra dentro de casa como se nada estivesse acontecendo (e por falar em Beverlly, quando lembro do que essa guria passou quando criança e viu isto se repetir quando adulta, me dá uma tristeza imensa, principalmente por saber que esta é a realidade de muitas mulheres por aí...) 

Apesar de imenso, o livro consegue te prender e o final vertiginoso é devorado como a voracidade de um homem que encontra um oásis no deserto. Ainda temos de quebra uma passagem por entidades cósmicas do Kingverso representadas de forma mais clara em sua saga A Torre Negra. E, aqui cabe uma comentário breve: apesar do final célere, ele é meio maluco parecendo uma viagem de LSD que traz à tona o que eu disse lá no inicio desses apontamento: King não se preocupa muito com finais...

Ler It é como andar em uma montanha russa de emoções. Medo, alegria, felicidade, surpresa, nojo, raiva..., uma miríade de sensações que bagunçam nossa mente. São várias as situações que nos fazem lembrar de nós quando crianças e que são escritas de tal forma que é impossível não desejar um retorno ao passado pra reviver aqueles dias...

It, A Coisa é um livro que versa muito além de terror. É um tratado sobre como a amizade é importante e de como fatos marcantes na infância moldam nosso caráter futuro... 

Pode apostar seu couro nisso.

Obs.: lá pelo final do livro tem uma cena envolvendo Beverly que nem sei  direito o que pensar. Faz quase um mês que li o livro e ainda não cheguei a uma resolução quanto ao que vi. Entretanto, num primeiro momento achei desnecessário e de uma falta de tato muito grande do autor...


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It, a Coisa ( It, Eua, 1986)
Páginas: 1103
Autor:  Stephen King
Editora: Suma de Letras
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