Lembro
que quando era criança – parafraseando meu pai, “um peãozinho sem CPF” – uma
das coisas que mais me alegrava no natal não era o fato de estar de férias das
escolas e poder assistir televisão até
tarde, ou o fato de nossa casa estar lotada de gente e minha mãe não notar a as
travessuras que eu fazia: eram os brinquedos. Não necessariamente os
brinquedos, mas sim a forma como recebia o brinquedo...
Meus
pais, que por uma questão totalmente insana, sempre acordavam cedo e,
aproveitando que eu e meus irmãos teríamos ainda algumas horas de sono,
aproveitavam para (calma, calma, não é isso que você está pensando...) esconder
pela casa os brinquedos que haviam comprado para nos presentear. Quando
acordávamos, minha mãe fazia cara de que nada de diferente estava acontecendo e
sabíamos que ele havia deixado algum regalo pra cada um de nós em algum canto
escondido da casa. E sempre fazíamos isso ao som de ma boa música...
Uma
coisa que sempre foi frequente lá em casa foi música. Raras foram às vezes que
algum rádio ou vitrola (se você não sabe o que vitrola, lamento pela sua alma)
não estava berrando alguma melodia. Normalmente, nessas manhãs de véspera de
Natal, o som que embalava nossa “cassada
ao tesouro”, era alguma música de Elton
John. De noite, quando a carne estivesse assando e os copos de cerveja dos
adultos permaneciam mais vazios do que cheios, era sempre samba/pagode que
tocava mas, pela manhã, Elton John imperava impávido. Sendo assim, íamos eu e
meus irmãos embalados ao som de “Your
Song”, “Sacrifice”, “I guess that's why they call it the blues” e Blue Eyes”,
na busca até o final do arco íris pelo NOSSO
tesouro...
Se
você me perguntar, não sei especificar com precisão qual foi o melhor presente
que ganhei, ou o que na época me deixou mais feliz, mas hoje, alguns anos,
possivelmente décadas depois, tem um presente que lembro com muita clareza que
trouxe muita alegria pra mim e meu irmão...
Devia
ser por volta do ano de 1994 ou 1995. Assim como muitas famílias naquela época,
a nossa atravessava um período financeiro complicado. Era aquela velha máxima:
muito mês para pouco dinheiro. Mas os pais, aqueles que realmente merecem o
título de pais, dão um jeito de brotar um sorriso no rosto de seus filhos. E
meus pais eram desse grupo, meu chapa. Então, naquele final de ano a tradição
seguiu intacta: acordamos tarde, minha mãe fez sua cara de indiferente e fomos,
ouvindo “Time on my hands, Could be time
spent with you, Laughing like children” em busca de nossos brinquedos. Via
de regra, eu e meu irmão recebíamos presentes iguais para que não houvesse
briga, então, naquela ano, ambos recebemos um carretel de linha usado com uma
madeira no meio que fazia o carretel rodar no próprio eixo fazendo com que a
peça emulasse um pião. Aquele presente artesanal, feito e entregue pelos meus
pais numa alternativa a falta de dinheiro, foi o que de melhor uma criança pode
receber: amor...
Hoje,
tantos anos depois, lembro deste dia com felicidade porque, apesar de querer
receber um video game, ou um patins, ou um skate, o pião artesanal deu mais
sentido a tudo aquilo. Todo aquele ritual (pais acordão cedo, cara de
indiferente da mãe, música do Elton John, busca pelo tesouro) não era só um modo de presentear-nos, e sim
uma forma de nossos pais demonstrarem que, independente de tudo – de seus
problemas, de seus erros, de suas aspirações – eles estariam sempre ali pra nos
ajudar, nos proteger e dar amor. Pode alguma criança querer mais que isso? E,
ainda, fazia com que nossa mente infantil vivesse toda aquela aventura de uma
forma mágica e espetacular que só as acrianças sabem fazer...
Neste
dia das crianças, insira no seu filho/neto/sobrinho/ou qualquer criança que eseja
perto essa chama da alegria, da felicidade, do sentimento de proteção. Mostre
pra ela que ainda que o mundo esteja desabando, você fará o possível para achar
uma viga de sustentação e seguir a diante. Faça com que dali a vinte, trinta,
quarenta anos depois, ela tenha motivos pra se lembrar daquela época que jaz no
fundo da memória com aquela saudade gostosa e perceber que aquelas gestos
simples fizeram milagres para aquele adulto que se formou...
E,
acima de tudo, dê AMOR. Sempre que
muitas coisas boas estão ausentes ou coisa ruins em abundância, é o amor que
opera os verdadeiros milagres...
Faça
tudo isso, de preferencia ao som do bom e velho Elton John...
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